domingo, 10 de agosto de 2014

A Manutenção da Paz em Moçambique

A Manutenção da Paz em Moçambique


*Custódio Sumbane
A Paz é resultado da tolerância, paciência e respeito pelas diferenças. A história nos mostra que a busca pela Paz é inerente ao ser humano, (Ferreira et al, 2006: 3). Recuando para a idade remota encontra-se que a destruição do mundo e dos direitos humanos como forma de mostrar o poder ou atitude de superioridade e descriminação com relação aos outros.

No holocausto judeu, por exemplo, mais de um milhão de crianças e adolescentes morreram. Choravam, gritavam, sentiam dores, frio e fome mas ninguém as socorria. Foram colocadas num depósito humano, pior do que uma pocilga. Não podiam andar nas ruas, comprar, ter amigos, ter carinho de seus pais e ir para a escola. Neste caso, os direitos humanos foram destruídos, Cury (2002:98-99).
Este cenário não se difere tanto das crianças moçambicanas que são aprisionadas o território da sua emoção (o alicerce da felicidade) e invadidas nas suas próprias casas como se fossem pássaros na machamba. São obrigadas a passar noites nas matas com animais perigosos que colocam, de algum modo, em risco a sua vida. Contudo, pode se dizer que as guerras são resultados da intolerância, impaciência, e a falta de respeito pelas diferenças que fazem com que milhares de crianças, adolescentes, adultos e velhos deixem de gozar dos verdes solos prometidos na terra.
Entretanto, é de suma importância invocar Santana, (2012:5), para nos trazer alguns episódios ocorridos na história da humanidade, resultados da intolerância. Neste caso, está-se a falar do Nazismo instaurado pelo ditador Adolfo Hitler (Holocausto Judeu); A destruição de Hiroshima e Nagasaki (Japão), no episódio da Segunda Guerra Mundial; o Apartheid (África do Sul); A colonização indígena; A escravidão negra, que perdurou décadas e tantas outras atrocidades acometidas contra grupos humanos e hoje a Tensão Político-Militar (Moçambique). Essas violências foram e são, antes de tudo, consequência da intolerância com os grupos que manifestavam suas diferenças ao padrão de igualdade estabelecido por camadas mantedoras do poder.
Será que dentro destas guerras se teve em consideração a Declaração Universal dos Direitos Humanos aprovada a 10 de Dezembro de 1948 pela Organização das Nações Unidas (ONU)?
Contudo, deve se prestar muita atenção com a infância, pois é nesta fase onde se constrói a personalidade do indivíduo, se desenvolve a autonomia, a socialização, a moralidade, o saber ser, saber estar e lidar com os outros. E, igualmente, determina­­-se a personalidade do indivíduo, ou seja, todos os aspectos segundo Freud, vivenciados nesta fase (infância) determinam a personalidade da criança. Sendo assim, é preciso ter muita atenção ou cuidado com esta fase, visto que as crianças aprendem através da observação e imitação de modelos (pais, professores, tios, irmãos, amigos, enfim).

Sendo assim, vale apena recordar um dos mais importantes Líderes do Movimento dos Direitos Civis dos Negros nos Estados Unidos, e no Mundo, Marthin Luther King Jr. (1929-1968), quando dizia: “O que me preocupa não é o grito dos maus, dos indivíduos sem carácter mas sim o silêncio dos bons”. Aliado a este pensamento diria que a minha grande e maior preocupação são as “crianças”, que choram mas ninguém as ouve, que suplicam mas ninguém as socorre, que falam mas ninguém as percebe. São seres consideradas irresponsáveis, pequenos em altura e idade, vistas como seres que não pensam, não percebem e sem sentimentos. Que situação triste! Daí são aterrorizadas os solos da sua emoção como quem não é digno de respeito. Vale ainda realçar que as guerras causam traumas nas crianças, desenvolvem um espírito de guerra e não de ajuda ao próximo. Constrói uma personalidade com atitudes desumanas; Desenvolve indivíduos com perturbações de conduta, enfim.

Para fundamentar as ideias anteriormente ditas, poder-se-ia focalizar os resultados encontrados nas pesquisas realizadas pela Associação Reconstruindo a Esperança (1994-2002 e 2003-2007) e Instituto de Psicotraumatologia de Moçambique, com Ex-Crianças Soldados instrumentalizadas pelas forças beligerantes durante a guerra dos 16 anos (1976-1992), que teve lugar em Moçambique. Das investigações realizadas pela ARES e pelo IPM constataram-se nas crianças e jovens os seguintes distúrbios no domínio psicológico:
*      Socialização: crianças e jovens revelam distúrbios no processo de socialização, particularmente na interiorização de valores e normas sociais e éticos. Eframe Jr, (1996),cit in. Revista PSIQUE (2011:26), reporta ainda casos de delinquência infantil e juvenil, de desrespeito dos pais e outros adultos por parte de algumas crianças e jovens ex-soldados.
*      Personalidade: Falta de confiança nos adultos e em si próprios, falta de perspectiva do seu futuro e ou perspectiva pessimista do seu futuro, isolamento, depressões, resignação, altos índices de agressividade, perca de sensibilidade, regressão, introversão, fobias diversas, falta de mecanismos adequados para a resolução de conflitos, capacidade muito limitada de aceitar frustrações, sintomas neuróticos diversos, etc.
*      Capacidades cognitivas: As crianças apresentam distúrbios nas capacidades secundárias da inteligência, tais como concentração, memoria, flexibilidade intelectual.
*      Sistema vegetativo: Os sintomas mais frequentes diagnosticados são os seguintes: cansaço constante, tonturas, distúrbios de sono, dores de cabeça frequentes, dores de estômago e incontinência, Revista PSIQUE (2011:26).
Contudo, depois das várias atrocidades cometidas e dos distúrbios causados nas ex-crianças soldados, é de extrema importância invocar Marthin Luther King Jr. (1929-1968), para nos situar das suas belíssimas palavras: Se um homem não tem algo na qual morreria não merece viver. Esta é a grande questão que se coloca a todos e em especial aos estudantes. Será que vós têm algo na qual preferiria deixar a vossa vida por ela? Antes de responder a esta questão significa que “não merecem viver”, segundo o libertador dos negros americanos e do mundo, que sempre se preocupou pela igualdade e a não-violência (Marthin Luther King).

Entretanto, este é o desafio que se coloca à Educação especialmente as Universidades de formar estudantes cientistas, capazes de ver o mundo numa outra perspectiva. Indivíduos activos na arte de pensar. Que se preocupam com o mundo e não consigo mesmos. Indivíduos que fazem a diferença em várias perspectivas. Em suma, indivíduos revolucionários.
Portanto, a tolerância, reciprocidade e solidariedade, cooperação, força de vontade, autonomia e coerência, capacidade de se colocar no lugar do outro, de dialogar, de conversar são valores essenciais para se tecer a paz, (Ferreira et al, 2006: 3-4).


*Licenciando em Psicologia Educacional
2014